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'Temos o desafio de mudar a cultura do empreendedor', diz o presidente do Sebrae

Segundo Luiz Barretto, um dos objetivos para 2015 é conscientizar sobre a importância da capacitação como investimento

Luiz Barretto, presidente do Sebrae Nacional, se diz satisfeito com o ano de 2014, visto por ele como positivo para os pequenos e médios empreendedores, e que superou as expectativas com a abertura de 1,3 milhão de empresas até novembro em todo o país. O desafio agora, afirma ele, é manter o ritmo em 2015, implantar um regime de transição tributária que estimule o crescimento dos negócios — hoje boa parta dos pequenos teme crescer por ter que pagar mais impostos ao mudar de faixa de faturamento — e conscientizar que a capacitação é um investimento.

Qual é o balanço que o Sebrae faz da atuação das micro, pequenas e médias empresas em 2014?

O ano de 2014 foi muito positivo para os pequenos negócios. Apenas entre os meses de janeiro e novembro do ano passado, foram criadas aproximadamente 1,3 milhão de empresas. Esse número já é superior ao total de empresas criadas em 2013. Ao longo de todo o ano passado, foram formalizados um milhão de empreendimentos. Hoje, o Brasil conta com 9,5 milhões de micro e pequenas empresas optantes pelo Supersimples. Em 2007, quando esse regime foi criado, esse número era de 2,6 milhões.

Mais empresas aderiram ao Simples. Mas muitos segmentos ficaram de fora. Como o Sebrae vai ajudar a incluir as categorias que ainda estão faltando?

Com as mudanças aprovadas no Congresso no mês de agosto de 2014, o Supersimples passou a ser universal e a atender aos setores de Comércio, Indústria, Construção Civil e Serviços. Apenas pouquíssimas atividades bastante específicas, como a produção de bebidas alcoólicas e de cigarros, ficaram de fora. A universalização do Supersimples estendeu os benefícios do regime simplificado de tributação às atividades de natureza intelectual, que fazem parte do setor de Serviços. Agora, o único critério para adesão das empresas passa a ser o faturamento, de no máximo R$ 3,6 milhões por ano. O resultado dessa ação é que mais de 140 atividades, como por exemplo medicina, advocacia, engenharia, consultoria, corretagem e fisioterapia, poderão optar pelo sistema de tributação que unifica oito impostos e que pode reduzir essa cobrança em até 40%, a depender do caso.

Que avanços foram conquistados pelas PMEs no ano passado?

Um dos maiores avanços que tivemos foi a aprovação, no Congresso Nacional, da revisão da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. Entre as principais alterações estão a universalização do Supersimples, a moralização do uso da substituição tributária e a criação de um cadastro único. A nova lei se destaca principalmente pelo aspecto da desburocratização, mas também foram tratadas questões de inclusão produtiva, acesso a mercados e crédito.

Quais são as perspectivas para 2015 no segmento? O que deve ser o maior desafio?

Temos um desafio enorme que é mudar a cultura do empreendedor brasileiro para que ele trate a capacitação como investimento. Invista seu tempo na preparação, no estudo, no planejamento. Muito se fala das dificuldades no ambiente de negócios, mas o que faz a verdadeira diferença é a gestão da porta para dentro da empresa. Nós demos um grande passo ao tornar a educação empreendedora um programa nacional do Sebrae e acabamos de inaugurar o Centro Sebrae de Educação Empreendedora, em Belo Horizonte. Vamos dar prosseguimento a nossa atuação na educação continuada, capacitação e cursos, a fim de aumentar o atendimento aos nossos clientes. Sob o aspecto do ambiente legal, nosso próximo desafio é implantar um regime de transição para estimular o crescimento dos empreendedores. Atualmente, as pequenas empresas têm medo de crescer porque, quando mudam de faixa, mudam de imposto sobre todo o faturamento.

A carga tributária continua sendo um grande entrave para o desenvolvimento das pequenas empresas. Como o Sebrae vai trabalhar, junto ao novo governo, para resolver essa questão, reduzindo este peso?

O Sebrae e a Secretaria da Micro e Pequena Empresa já apresentaram à Frente Parlamentar Mista da Micro e Pequena Empresa no Congresso Nacional o estudo elaborado pelas fundações Getúlio Vargas e Dom Cabral, juntamente com o Instituto de Pesquisas Econômicas, que propõe novos aperfeiçoamentos à lei. Entre as propostas apresentadas estão a criação de tetos de transição de R$ 7,2 milhões e de R$ 14,4 milhões; a implementação de uma faixa de transição para os microempreendedores individuais (MEI) entre R$ 60 mil e R$ 120 mil; a diminuição de faixas de tributação de 20 para sete e a redução do número de tabelas, passando de seis para quatro.

E quais serão os impactos caso esses aperfeiçoamentos sejam aprovados?

De acordo com a proposta, seria criada uma faixa para o Comércio, uma para a Indústria e duas para o setor de Serviços. A primeira unifica as atuais tabelas de serviços reduzindo a burocracia e suavizando as alíquotas de impostos, e outra que propõe melhorias na tributação a que estão sujeitos os profissionais liberais que ingressaram no Simples com a universalização promovida pela última alteração no Estatuto da Pequena Empresa. O estudo propõe ainda mecanismos para tributar de forma mais adequada essas atividades quando a folha pagamento representar mais de 22,5% do seu faturamento. Isso seria um estímulo para a criação de novos empregos nos setores que foram incluídos agora no Simples.

Qual foi a receptividade dos deputados ?

Os deputados se comprometeram em apresentar um projeto, a partir dessas contribuições, e nós vamos acompanhar e mobilizar os parlamentares para aprovarem as mudanças ainda em 2015. Além disso, queremos continuar com os estudos e pesquisas para subsidiar o processo de aprimoramento da legislação.

Exportar ainda é um desafio para as PMEs. Como melhorar a performance destas empresas e de que maneira estimulá-las a investir em exportação?

Os empresários precisam pensar muito bem antes de decidir ingressar no mercado internacional e avaliar os riscos de atuar no exterior. Entre os perigos que a empresa corre estão o de perder o foco do seu negócio, aumentar a necessidade de fluxo de caixa, gerenciar as variações cambiais e não possuir informações suficientes sobre o mercado para o qual quer vender seus produtos. Para superar os desafios do comércio internacional e reduzir os novos riscos inerentes a esse processo, é necessário que os empresários de pequenos negócios se conscientizem da necessidade de planejamento e de preparação. O comércio exterior não é um golpe de sorte. Pode até ocorrer alguma operação esporádica, porém, sem planejamento e preparação o processo de acessar mercados internacionais não se sustenta no médio e longo prazo. É fundamental estabelecer o plano de acesso a mercados externos.

Que mercados podem ser os destinos mais promissores para as exportações de micro e pequenas empresas nacionais?

Países da América Latina, como Chile, México, Paraguai, Colômbia, Bolívia e Peru devem ter um bom crescimento econômico em 2015 e podem se tornar mercados potenciais para as micro e pequenas empresas. Isso sem falar da Argentina, principal parceiro do Brasil no Mercosul que, apesar de não apresentar um mercado aquecido, sempre é um destino a ser lembrado para os produtos brasileiros. Além dos países do bloco Ásia-Pacífico, são esses países da América Latina onde atualmente estão reunidas as melhores oportunidades para as exportações das nossas micro e pequenas empresas.

Às vésperas das Olimpíadas, veremos um boom de novas empresas voltadas para esse setor? Como torná-las sustentáveis?

Eventos como Copa e Olimpíadas são excelentes oportunidades e os pequenos negócios não podem ficar de fora. Nossa expectativa é extremamente positiva a partir dos resultados do Programa Sebrae 2014, que gerou R$ 560 milhões em negócios para 50 mil micro e pequenas empresas atendidas pela instituição. Assim como a Copa, as Olimpíadas significam uma oportunidade única para uma mudança de padrões, comportamentos e para a projeção da imagem do país. Nesse sentido, o Sebrae no Rio de Janeiro já iniciou a preparação de micro e pequenas empresas para 2016, porque além do aumento nas vendas, os megaeventos trazem um novo padrão de exigências e as empresas precisam estar preparadas para atender a um mercado cada vez mais pautado pela competitividade e pela sustentabilidade.

A figura do MEI vem crescendo no país. Qual é a meta do Sebrae na conquista de mais empreendedores individuais?

Apenas entre os meses de janeiro e novembro do ano passado, cerca de um milhão de pessoas se formalizaram como Microempreendedor Individual (MEI) — aquele que fatura até R$ 60 mil por ano. Desde 2009, quando essa figura jurídica começou a existir, mais de 4,6 milhões de empreendedores puderam se formalizar sem burocracia e sem custos. Acreditamos que nos próximos anos essa figura jurídica continuará formalizando milhões por ano. Nesse contexto, nossa meta é atender a esse público e apoiá-los para que se mantenham e se fortaleçam no mercado. Para isso estamos investindo fortemente em capacitação, principalmente no aspecto da gestão do negócio.

Como está a sobrevivência das PMEs no Brasil?

Há uma década, cerca de metade das micro e pequenas empresas fechava as portas antes de completar dois anos de atividade. Hoje, a situação se inverteu completamente. De cada cem empresas criadas no Brasil, 76 sobrevivem aos dois primeiros anos de vida. Essa taxa, em crescimento nos últimos anos, mostra uma melhor capacidade das micro e pequenas empresas para superar dificuldades nos primeiros anos do negócio. A taxa de sobrevivência para empresas com até dois anos de idade é bastante alta, inclusive quando comparamos com outros países. Sempre haverá um percentual de insucesso, porque empreender envolve risco. Mas, qualquer taxa de sobrevivência acima de 70% já pode ser considerada muito positiva.

Em relação a outros países, quanto ainda precisamos avançar?

Se compararmos a sobrevivência dos negócios no Brasil com o estudo feito pela OECD (Organisation for Economic Co-operation and Development), percebemos que o país ocupa a segunda posição do ranking, empatado com Luxemburgo, com 76%. Apenas a Eslovênia tem uma taxa maior, de 78%. Estamos hoje à frente de países como o Canadá, que tem 74%, Espanha, com 69%, e Portugal, que tem 51%.

Brasil Econômico